sábado, 26 de junho de 2010

O Diário do Caminho: II Parte, O Caminho de Fisterra


















30º Dia, 18 de Maio, Fisterra – Múxia (o fim do Caminho!)

Foi precisamente a última noite no Caminho que me reservou uma surpresa nada agradável: qualquer coisa que comi na véspera, provavelmente ao jantar deve-me ter provocado paragem de digestão, pois às 03h30 da manhã vomitei parte do jantar, praticamente como se o tivesse acabado de comer. Por volta das 06h00 da manhã voltei a vomitar, embora já com menos intensidade! Desidratei imenso e pior do que isso estava sem apetite! Não era de todo um bom prenúncio para quem tinha pela frente cerca de 30 km a pé. Logo no último dia do Caminho, era preciso ter galo! Tomei umas pastilhas para a acidez no estômago, mas a coisa pouco melhorou. A minha salvação foram os comprimidos naturais de alcachofra que já tinham feito milagres com o Alexandre! Fui tomando um antes de cada refeição e o que é certo é que foram um verdadeiro elixir para a minha maleita! A parte inicial da caminhada foi um pouco difícil e pela primeira vez em 30 dias nunca desejei tanto em chegar o mais depressa possível ao destino! Bebi 2 litros de água até às 11h00 da manhã, tal tinha sido a desidratação provocada pelo desarranjo no estômago! Mas à medida que os comprimidos de alcachofra começaram a fazer efeito a coisa pareceu melhorar gradualmente! Ao longo do dia comi coisas bastante leves e bebi muita água. Voltando ao percurso, os 30,3 km que separavam Fisterra de Múxia foram os mais mal sinalizados do Caminho: falta de setas em muitos sítios, marcos que ofereciam muitas dúvidas quanto ao sentido do percurso, falta de sinalização na saída de Fisterra e parte do caminho cortado antes da praia do Lourido. Destaco 2 momentos de aventura e de adrenalina nesta etapa: a travessia a vau do rio Lires, o seu caudal subiu e cobriu o passadiço em pedra, pelo que, botas e meias ao pescoço e com a ajuda do bastão toca a passar o rio a penantes, com a água fria como o gelo, facto que não impediu um peregrino mais afoito que vinha atrás de nós de se despir e de se banhar ali mesmo, penso que era um jovem americano que seguia com um peregrino mais velho. O 2º momento de aventura foi provocado, como já disse, pela deficiente sinalização do caminho e pelo corte de parte do percurso imediatamente antes da praia do Lourido: eu e o Delfino vínhamos a seguir um grupo de peregrinos que seguia no nossa frente que, pelas razões já apontadas, saíu do caminho certo, moral da história: tivemos que saltar 3 muros de pedra solta e atravessar uma seara! Quem não dever ter achado muita piada foi um peregrino que seguia na nossa dianteira com um carrinho de rodas onde levava a as suas coisas, não foi tarefa fácil transpor os obstáculos com a sua mochila volante! Às 15h30 eu e o Delfino chegávamos a Múxia! Terminava oficialmente a nossa travessia do Caminho Francês de Santiago de Compostela! Encaminhámo-nos para o albergue municipal que (para variar…) ficava localizado no extremo oposto ao que nós tínhamos entrado. Carimbámos a credencial e foi-nos entregue a Muxiana! Às 18h30 fiz uma refeição bastante leve no bar Xardim. Comprei mais comida e bebida não fosse dar-me fome lá mais para a noite. Descansei um pouco no albergue e por volta das 20h30 peguei na máquina fotográfica do Delfino e fui até ao Santuário da Virgem da Barca, um dos locais míticos de Múxia, que distava 1 km da povoação. A entrada do Santuário estava voltada ao mar, de tal forma que, nos dias em que este estivesse mais bravo, deveria certamente fustigar a entrada da igreja! Tirei fotografias ao local, ao mar e a toda a zona envolvente! O sol estava a preparar-se para se esconder e por momentos lembrei-me do espectáculo da véspera no Cabo Fisterra! Cruzei-me com uma peregrina asiática que por ali deambulava e pedi-lhe se me podia tirar uma foto, ela assentiu e pediu-me também que lhe tirasse uma fotografia com a sua máquina. Fiquei um pouco mais por ali, era um local que convidava à reflexão, sentei-me numa rocha voltada ao mar, que paz de espírito: por breves momentos passaram-me pela mente o filme das nossas vidas nos últimos 30 dias! Momentos inesquecíveis! Chegava ao fim a nossa fantástica aventura no Caminho Francês de Santiago de Compostela! Restava-nos agora muitas histórias para contar, muitos locais e, acima de tudo, muitos Amigos para recordar! “Despertei” do sonho e regressei à povoação. Ainda fiz companhia ao Pimpão e ao Alexandre no terraço do albergue, onde aproveitei para comer uma fatia de tarte de maçã, fruta e beber sumo. A gastroenterite da noite anterior já era uma miragem! Mais tarde juntou-se a nós o Castro. Mais umas fotografias ao por do sol e às 22h00 preparamo-nos para dormir a nossa ultima noite num albergue do Caminho!

Texto: Sérgio Cebola
Fotos: António Delfino, António Pimpão e Rosalino Castro

1 a 4 – Junto à praia de Lires
5 a 7 – Travessia a vau do rio Lires
8 – Praia de Lourido
9 a 12 – Múxia
13 a 18 – junto ao Santuário da Virgem da Barca (Múxia)

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