Retomámos o Caminho às 07h05 e a meio da manhã chegávamos a Carrión de Los Condes, uma cidade simpática e já com alguma dimensão, detentora de um património edificado bastante considerável, com particular relevo, para o religioso (uma constante ao longo do Caminho…), como são o caso do Mosteiro de Santa Clara, da Igreja de Santa Maria e do Mosteiro de San Zoilo, este último com uma fachada fantástica, uma autêntica aula de história da arte ao vivo! Este mosteiro alberga no seu interior um hotel. Esta etapa foi aquilo que se designa por uma verdadeira linha recta, praticamente sem descidas e sem subidas e com algum alcatrão. A condição física do António Delfino estava a melhorar bastante, o tempo estava fresco e o percurso era muito plano, aspectos que contribuíram para que a nossa chegada ao destino se verificasse um pouco antes do horário previsto. Paisagem um pouco monótona: amplos campos de cereais, sem arvoredo. Entre Carrión de los Condes e Calzadilla de la Cueza, palmilhámos 17,2 km sem civilização, sem povoações e pior que tudo isto, sem fontes de água potável! Caminho e mais Caminho, sem nada mais! O troço mais extenso nesta condição, desde a etapa dos Pirinéus, ainda no sul de França! Efectuámos uma merecida paragem a 8 km de Calzadilla, num pequeno bar improvisado num contentor de metal, com o sugestivo nome de Oásis! Aqui carimbámos as credenciais, reabastecemos de água, comemos alguma coisa e bebemos uma lata de cerveja! Já em Carrión havíamos parado para reconfortar os estômagos, num bar junto à estátua em homenagem ao peregrino. Já muito perto de Calzadilla cruzei-me (cruzámo-nos eu e o Delfino) com a Georgette, a holandesa bastante peculiar que tínhamos conhecido em Población de Campos, estava parada, a mudar o Kiko do carrinho para um apetrecho que tinha colocado nos ombros e cintura para poder transportar o seu filho em segurança durante a caminhada. Perguntei-lhe se estava tudo bem e se precisava de ajuda, ao que ela me respondeu com um sorridente “Non passa nada!”, que estava tudo bem! Ainda assim e até Calzadilla, mantivemo-nos a uma curta distância, não fosse necessário ajudar nalguma coisa. O Kiko ia bastante satisfeito e distraído com a conversa que a mãe ia mantendo com ele! Às 15h15 chegámos a Calzadilla de la Cueza, com o céu a ficar muito carregado de nuvens cinzentas, prenúncio de alguma chuva nos próximos dias! Após o habitual ritual pós-caminhada, fomos até a um bar local confraternizar com a rapaziada que ali tinha chegado connosco nesse dia. Lá apareceu também a Georgette com o Kiko que, quando viu o pessoal, reconheceu logo as caras, especialmente a do “Santa Claus” (pai Natal), como simpaticamente a Georgette chamava ao Castro, dizendo ela até em jeito de piada, que já o conhecia melhor a ele do que ao próprio pai, coisas do Caminho! Voltamos a juntar uma grande “equipa” ao jantar: o Alexandre e o Luís que já há algum tempo caminhavam connosco, o António de Lugo, que conhecemos em Torres del Rio, o Javi, o Rafael e ainda um peregrino espanhol de barbas que não cheguei a fixar o nome. Foi uma tarde e uma noite bastante animada, ainda para mais com os 32,8 km percorridos nesse dia até Calzadilla de la Cueza, tínhamos chegado ao bonito número de 390 km palmilhados, nada mais, nada menos do que metade do Caminho Real Francês, desde a nossa partida de Saint-Jean-Pied-de-Port, no sul de França, pelo que havia razões de sobra para comemorar!
P.S. - O Pimpão e companhia reencontraram o André entre Carrión e Calzadilla.
Texto: Sérgio Cebola
Fotos: 1 a 8, 10, 12 e 14 (António Delfino), fotos 9, 11 e 13 (António Pimpão)
1 – A caminho de Carrión de los Condes
2 – Carrión de los Condes
3 – Mosteiro de Santa Clara (séc. XIII)
4 – Monumento em homenagem ao peregrino em Carrión
5 – Interior da Igreja de Santa Maria em Carrión
6 – Mosteiro de San Zoilo em Carrión (sécs. XI – XVIII)
7 – A “travessia do deserto” entre Carrión e Calzadilla
8 – A Georgette e o Kiko já perto de Calzadilla de la Cueza
9 – O reencontro com o André
10 – Calzadilla de la Cueza no horizonte
11 – A Georgette a mudar o Kiko do carrinho para a sua ilharga
12 – O António Delfino à chegada a Calzadilla de la Cueza
13 – O Castro com o Kiko
14 – Um jantar muito animado em Calzadilla