sábado, 12 de junho de 2010

O Diário do Caminho: 16º Dia, 4 de Maio, Puente Villarente – Villadangos del Páramo












Após um excelente pequeno-almoço no albergue e uma foto de grupo à partida, retomámos o Caminho de Santiago às 07h05 da manhã, com um frio terrível e alguma neve já nas proximidades de León. Os vaticínios da véspera estavam a bater certo! Uma temperatura destas no mês de Maio, decididamente o tempo não nada bem e ainda por cima estávamos numa cota de 840 metros de altitude, pelo que o frio e a neve faziam-se sentir com mais intensidade. Depois do bom tempo e do calor que já tínhamos apanhado, quem diria que iríamos, em tão pouco tempo, levar com o reverso da medalha! À passagem por Puente Castro tive que colocar mais um par de meias, tive que vestir umas calças corta-vento por cima das outras e vestir também um anorak! Isto tudo a juntar às luvas e ao passa-montanhas que já trazia da véspera! A marcação do Caminho está bastante confusa à entrada da cidade de León, a “febre” de alguns proprietários de albergues fez com que estes colocassem setas por todo o lado a sinalizarem os albergues e não o Caminho! Alguns peregrinos que encontrámos já na saída da cidade confirmaram-nos isso mesmo! Moral da história: chegámos mais cedo à saída da cidade, à ponte sobre o rio Bernesga, sem termos passado pelos principais monumentos da cidade, incluindo a Catedral. Sorte a nossa que o Pimpão e o Castro e companhia seguiram o Caminho certo e tiraram algumas fotos! Ainda assim registámos em foto a Arena e os “leões” de León! “Desayunamos” pela 2ª vez em Virgen del Camino: bocadillos de jambón com queijo e vinho tinto. Em San Miguel del Camino o Delfino tirou uma fotografia fantástica a um campanário de uma igreja engalanada com 5 ninhos de cegonha! Voltámos a percorrer um troço de percurso muito monótono, ao lado da Estrada Nacional 120, com muito barulho do imenso trânsito que se fazia sentir entre Léon e Astorga. Ficámos alojados no albergue municipal de Villadangos del Páramo, onde chegámos às 15h15, após mais 33,2 km percorridos! O Luís perdeu-se em Virgen del Camino (fruto ainda da má marcação do Caminho…). O António (de Lugo) está de novo connosco!

Texto: Sérgio Cebola

Fotos: 1 a 4 e 7 a 11 (António Delfino), fotos 5 e 6 (António Pimpão)

1 – Partida do albergue San Pelayo (Puente Villarente)

2 – Passadiço por cima da estrada nas proximidades de León

3 – A cidade de León em pano de fundo

4 – Na cidade de Léon

5 – León - Casa de Botines (Antonio Gaudi, séc. XIX)

6 – Catedral de León

7- Junto à Arena de León

8 – Mais um monumento ao peregrino, em Virgen del Camino

9 – Um campanário de uma igreja bastante original em San Miguel del Camino

10 – Publicidade a uma adega/restaurante, também bastante original

11 – À chegada a Villdangos del Páramo

sexta-feira, 11 de junho de 2010

O Diário do Caminho: 15º Dia, 3 de Maio, Bercianos del Real Camino – Puente Villarente











Às 06h45, ainda o sol não tinha nascido e já nós estávamos de novo no Caminho, desta feita à “conquista” de Puente Villarente. Deixou de estar fresco para começar a estar frio e ainda por cima com muito vento! Tanto foi que tive que meter o passa-montanhas e as luvas! Efectuámos uma breve paragem em Manzilla de las Mulas para “desayunar” bocadillos de tortilla e de queijo com presunto, devidamente acompanhados com o inevitável vinho tinto! O percurso foi muito monótono, sempre com a mesma paisagem, sem grandes pontos de interesse, com a agravante de ser quase sempre perpendicular à estrada. Excepção à regra foi a bonita ponte sobre o rio Porma, na entrada de Puente Villarente, ainda assim a necessitar de urgentes trabalhos de beneficiação. A este respeito o nosso guia assinalava mesmo travessia de “ponte perigosa”! Foi também o dia em que eu e o Delfino terminámos mais cedo a jornada: às 14h28! Ainda por cima numa das etapas mais longas: 33 km! O tempo fresco (e frio…), a etapa plana e o facto de só termos feito uma paragem justificam esta nossa chegada mais cedo do que o habitual. Ficámos muito bem instalados no melhor albergue de todos até a esta etapa: o San Pelayo! Por cerca de 20 € cada um, tivemos direito a dormida, banho, jantar, lavar e secar roupa e pequeno-almoço! Muito bom, de fazer inveja a muitos hotéis! Dispunha de umas instalações muito acolhedoras, com lareira acesa (que bem se agradecia, tal era o frio…), cozinha à nossa disposição e internet! Ficámos num quarto que só tinha mais uma pessoa para além do nosso grupo, um irlandês ou inglês (não estou bem certo), já entradote, que tínhamos encontrado uma ou duas vezes, penso que a partir de Calzadilla de la Cueza, e a quem o Alexandre simpaticamente apelidava de “Mr. Jones”! O Javi e o António (de Lugo) devem ter ficado num albergue antes de Puente Villarente! O Alexandre e o Luís continuavam connosco. Hoje lembrei-me do Hernâni, o outro companheiro brasileiro que deixámos em Viana! Espero que esteja tudo a correr bem com ele! A hospitaleira do albergue era muito simpática, disse-nos que já tinha sido emigrante em França, isto a propósito de lhe termos dito que tínhamos começado o Caminho em Saint-Jean-Pied-de-Port e do Delfino lhe ter dito também que era emigrante em Joué-les-Tours. Disse-nos que o tempo em Espanha andava “muy loco” e que estava a nevar a 40 km de Puente Villarente! Escusado ser dizer que, perante estas informações, começamos logo imaginar e conjecturar cenários futuros, ou seja, as etapas de montanha que se avizinhavam, Foncebadón e o Cebreiro, a 1440 e 1300 metros de altitude, respectivamente! Começamos logo a fazer figas para que o tempo estivesse melhor nessa altura! Após 15 dias no Caminho e pese embora algumas mazelas decorrentes da realização do mesmo, o pessoal estava muito confiante e animado! Faltavam 323, 7 km para Santiago! Após (mais um…) repasto muito bem composto, fomos até à acolhedora lareira na cozinha do albergue. Lá tinha jantado 2 peregrinas, penso que alemãs, que nos ofereceram ananás de sobremesa e vinho tinto! O Alexandre fez logo as honras da casa agradecendo a simpatia das senhoras! Entre a lareira e a internet ocupámos o tempo até à hora de dormir! Nunca o ditado “deitar cedo e cedo erguer…” fez tanto sentido como no Caminho de Santiago!
Texto: Sérgio Cebola

Fotos: 1, 9 e 10 (António Pimpão), fotos 2 a 8 (António Delfino)
1 – Mais um nascer do sol inesquecível (na saída de Bercianos…)
2, 3 – A caminho de Manzilla de las Mulas, com um vento muito frio
4 – Entre Manzilla e Puente Villarente
5 – Puente Villarente (sobre o rio Porma)
6 – À entrada da localidade de Puente Villarente
7, 8 – À lareira do albergue San Pelayo
9 – O jantar no albergue
10 – O Alexandre com as 2 peregrinas alemãs (agradecendo a oferta da sobremesa)

quinta-feira, 10 de junho de 2010

O Diário do Caminho: 14º Dia, 2 de Maio, Calzadilla de la Cueza – Bercianos del Real Camino



















Às 07h10 da manhã estávamos de novo no Caminho de Santiago, com uma passagem fugaz por Terradillos de los Templários (os cavaleiros do Templo também presentes na rota jacobeia), a deixar no nosso imaginário a ligação desta Ordem ao caminho de Santiago. Reparamos que por estas bandas, utilizam uma técnica artesanal de construção muito interessante para isolarem as habitações do calor e do frio, presumo eu. Trata-se de uma massa obtida da mistura de terra de barro molhada com palha e cascalho. E deve resultar, pois passámos por muitas casas rebocadas com este composto! Na etapa de hoje teve também lugar o nosso primeiro almoço volante, em jeito de pic nic, logo a seguir à ponte do rio Valderaduey, muito próximo de Sahágun: salada de tomate com atum à boa maneira portuga, bem regada com um tinto de Valladolid. À passagem por Sahágun reparamos numa placa que designava esta cidade como o centro do Caminho, nada como registar este momento com mais uma foto e outra também junto à estátua do peregrino, à entrada do albergue Cluny em Sahágun! Passámos, mais à frente, pela bonita ponte sobre o rio Cea e já muito perto de Bercianos del Real Camino contemplámos por alguns instantes a Ermida de Nossa Señora de Perales. O tempo continuava bastante fresco, o que nos permitia calcorrear o Caminho com menos dificuldade. Ainda me lembrava do que nos poderia ter sucedido naquele imenso troço (17,2 km) entre Carrión e Calzadilla se o tempo estivesse quente! Continuavam connosco os companheiros do costume: o Alexandre, o Luis, o António (de Lugo) e o Javi. O André está também no nosso albergue, que já está completo. Aqui chegámos às 15h25, muito bem recebidos por 2 simpáticas hospitaleiras que nos ofereceram limonada fresca com hortelã. O Castro e o Pimpão mais a restante companhia tinham chegado um pouco antes. Pela primeira vez iríamos participar e partilhar o nosso primeiro jantar comunitário num albergue. Aqui também não cobram nenhum valor fixo, aceitam donativo. Os 31,7 km hoje percorridos até Bercianos decorreram quase sempre ao lado da estrada, com algum arvoredo a espaços, fazendo esquecer um pouco as vastas searas. Deixámos hoje a província de Palencia e entrámos na de León, nas proximidades de Sahágun. Não vimos (eu e o Delfino) a Georgette nem o pequeno Kiko. O jantar comunitário foi composto de sopa de lentilhas com chouriço, pão, vinho, água e salada (macedónia) de frutas. O André também participou connosco neste animado jantar no albergue. Arrumada a cozinha e lavada a loiça, tempo ainda para uma partida de cartas, nada melhor que uma “sueca” para desanuviar um pouco! O recolher era às 22h00 pelo que nada melhor para ocupar o tempo até lá do que com uma boa “suecada”!

Texto: Sérgio Cebola

Fotos: 1 a 3 e 5 a 14 (A. Delfino), fotos 4 e 15 a 17 (A. Pimpão)

1 – Uma técnica muito interessante para isolamento das casas

2 – À chegada a Terradillos de los templários

3 – S. Nicolás del Real Camino

4 – Um animado “desayuno” com o António e o Javi em S. Nicolás

5 – Na fronteira entre Palencia e León

6 – A ponte sobre o rio Valderaduey

7 – Um almoço volante a seguir à ponte

8 – Junto ao albergue Cluny em Sahágun

9 – No centro do Caminho em Sahágun

10 – A ponte sobre o rio Cea

11 – Na saída de Sahágun

12 – A avifauna também presente no Caminho

13 – Um ponto de situação para confirmar o Caminho certo

14 – A Ermida de Nossa Señora de Perales

15, 16 – Um animado jantar comunitário no albergue de Bercianos

17 – Uma partida de “sueca” para desanuviar

quarta-feira, 9 de junho de 2010

O Diário do Caminho : 13º Dia, 1 de Maio, Población de Campos – Calzadilla de la Cueza















Retomámos o Caminho às 07h05 e a meio da manhã chegávamos a Carrión de Los Condes, uma cidade simpática e já com alguma dimensão, detentora de um património edificado bastante considerável, com particular relevo, para o religioso (uma constante ao longo do Caminho…), como são o caso do Mosteiro de Santa Clara, da Igreja de Santa Maria e do Mosteiro de San Zoilo, este último com uma fachada fantástica, uma autêntica aula de história da arte ao vivo! Este mosteiro alberga no seu interior um hotel. Esta etapa foi aquilo que se designa por uma verdadeira linha recta, praticamente sem descidas e sem subidas e com algum alcatrão. A condição física do António Delfino estava a melhorar bastante, o tempo estava fresco e o percurso era muito plano, aspectos que contribuíram para que a nossa chegada ao destino se verificasse um pouco antes do horário previsto. Paisagem um pouco monótona: amplos campos de cereais, sem arvoredo. Entre Carrión de los Condes e Calzadilla de la Cueza, palmilhámos 17,2 km sem civilização, sem povoações e pior que tudo isto, sem fontes de água potável! Caminho e mais Caminho, sem nada mais! O troço mais extenso nesta condição, desde a etapa dos Pirinéus, ainda no sul de França! Efectuámos uma merecida paragem a 8 km de Calzadilla, num pequeno bar improvisado num contentor de metal, com o sugestivo nome de Oásis! Aqui carimbámos as credenciais, reabastecemos de água, comemos alguma coisa e bebemos uma lata de cerveja! Já em Carrión havíamos parado para reconfortar os estômagos, num bar junto à estátua em homenagem ao peregrino. Já muito perto de Calzadilla cruzei-me (cruzámo-nos eu e o Delfino) com a Georgette, a holandesa bastante peculiar que tínhamos conhecido em Población de Campos, estava parada, a mudar o Kiko do carrinho para um apetrecho que tinha colocado nos ombros e cintura para poder transportar o seu filho em segurança durante a caminhada. Perguntei-lhe se estava tudo bem e se precisava de ajuda, ao que ela me respondeu com um sorridente “Non passa nada!”, que estava tudo bem! Ainda assim e até Calzadilla, mantivemo-nos a uma curta distância, não fosse necessário ajudar nalguma coisa. O Kiko ia bastante satisfeito e distraído com a conversa que a mãe ia mantendo com ele! Às 15h15 chegámos a Calzadilla de la Cueza, com o céu a ficar muito carregado de nuvens cinzentas, prenúncio de alguma chuva nos próximos dias! Após o habitual ritual pós-caminhada, fomos até a um bar local confraternizar com a rapaziada que ali tinha chegado connosco nesse dia. Lá apareceu também a Georgette com o Kiko que, quando viu o pessoal, reconheceu logo as caras, especialmente a do “Santa Claus” (pai Natal), como simpaticamente a Georgette chamava ao Castro, dizendo ela até em jeito de piada, que já o conhecia melhor a ele do que ao próprio pai, coisas do Caminho! Voltamos a juntar uma grande “equipa” ao jantar: o Alexandre e o Luís que já há algum tempo caminhavam connosco, o António de Lugo, que conhecemos em Torres del Rio, o Javi, o Rafael e ainda um peregrino espanhol de barbas que não cheguei a fixar o nome. Foi uma tarde e uma noite bastante animada, ainda para mais com os 32,8 km percorridos nesse dia até Calzadilla de la Cueza, tínhamos chegado ao bonito número de 390 km palmilhados, nada mais, nada menos do que metade do Caminho Real Francês, desde a nossa partida de Saint-Jean-Pied-de-Port, no sul de França, pelo que havia razões de sobra para comemorar!

P.S. - O Pimpão e companhia reencontraram o André entre Carrión e Calzadilla.

Texto: Sérgio Cebola

Fotos: 1 a 8, 10, 12 e 14 (António Delfino), fotos 9, 11 e 13 (António Pimpão)

1 – A caminho de Carrión de los Condes

2 – Carrión de los Condes

3 – Mosteiro de Santa Clara (séc. XIII)

4 – Monumento em homenagem ao peregrino em Carrión

5 – Interior da Igreja de Santa Maria em Carrión

6 – Mosteiro de San Zoilo em Carrión (sécs. XI – XVIII)

7 – A “travessia do deserto” entre Carrión e Calzadilla

8 – A Georgette e o Kiko já perto de Calzadilla de la Cueza

9 – O reencontro com o André

10 – Calzadilla de la Cueza no horizonte

11 – A Georgette a mudar o Kiko do carrinho para a sua ilharga

12 – O António Delfino à chegada a Calzadilla de la Cueza

13 – O Castro com o Kiko

14 – Um jantar muito animado em Calzadilla